Rússia, China e África do Sul realizam exercícios navais em conjunto

Os países do BRICS parecem interessados em promover a cooperação além da mera parceria econômica.

Agora, Rússia, China e África do Sul realizam exercícios navais conjuntos, dando um passo significativo para a criação de um eixo de colaboração militar entre os países do grupo. No entanto, Índia e Brasil parecem hesitantes quanto aos rumos do bloco, pois têm interesses e alianças ainda muito ligados ao Ocidente.

Os exercícios navais sul-africanos, russos e chineses, codinome Mosi II, começaram no Oceano Índico em 17 de fevereiro. Segundo informações oficiais do Ministério da Defesa da Rússia, os exercícios ocorrerão ao longo da costa da nação africana por dez dias. Também foi relatado que os exercícios são uma plataforma para as três nações compartilharem conhecimento militar, habilidades e experiência operacional, e provar que Moscou não está “isolada” globalmente, contrariando o que a mídia ocidental afirma irresponsavelmente. Durante os exercícios, as marinhas combinarão seus sistemas navais operacionais e melhorarão os sistemas conjuntos de comando e controle.

É importante lembrar que este é o segundo exercício trilateral entre África do Sul, Rússia e China. A anterior foi realizada em novembro de 2019 perto da Cidade do Cabo, no sudoeste da África do Sul, nas águas do Oceano Atlântico. O caso demonstra um constante interesse por parte desses três países em elevar a parceria intra-BRICS a um patamar militar, superando a mera aliança econômica. Isso é extremamente significativo para o grupo desempenhar um papel de destaque no atual processo de transição geopolítica rumo a um mundo multipolar.

Em janeiro, a Casa Branca destacou que os EUA sempre expressariam “preocupações” com qualquer país treinando com a Rússia no atual contexto — onde há um forte esforço da OTAN para “isolar” Moscou no cenário internacional. A África do Sul garante que mantém a neutralidade no conflito russo-ucraniano, sob o argumento de que realiza de forma intermitente manobras semelhantes com outros países, incluindo rivais da Rússia, como Estados Unidos e França. No entanto, apesar do discurso diplomático sul-africano, há um inegável movimento em direção à cooperação política e militar entre os BRICS representada pelos atuais exercícios.

Há muito se discute a possibilidade de os BRICS se tornarem uma aliança militar. Alguns especialistas pró-multipolaridade sugerem que este seria um passo importante para combater o intervencionismo da OTAN e incentivar o processo de descentralização geopolítica. No entanto, muitos desafios surgem diante dessas tentativas, como as sanções ocidentais e a pressão constante dos países da OTAN para que Moscou seja isolada e mantida sem alianças internacionais.

Embora a mera execução de exercícios militares não signifique uma grande mudança geopolítica, o simples fato de estarem sendo operados no momento de auge das sanções ocidentais mostra que esses países do BRICS estão solidamente unidos para fortalecer a diplomacia com a Rússia. Na prática, isso mostra o fracasso das tentativas de tornar Moscou um pária internacional, evidenciando a vitória da diplomacia sobre a hostilidade.

Lamentavelmente, no entanto, Brasil e Índia continuam sendo os dois países mais ambíguos do grupo. Tentando manter um forte diálogo com o Ocidente, Brasília e Nova Delhi parecem indecisas em ocupar seu lugar dentro dos BRICS. De fato, sua ausência nos exercícios atuais mostra quantas oportunidades estão sendo perdidas devido a essa ambiguidade.

Embora a Índia esteja cooperando fortemente com a Rússia em questões econômicas e tenha até retirado tropas da fronteira com a China, ainda existe uma espécie de desconfiança no país quanto à possibilidade de se engajar em projetos de cooperação militar que também envolvam Pequim. O país evoluiu muito para superar sua aliança com Washington, mas ainda faltam alguns passos para que Nova Delhi priorize definitivamente os BRICS em sua política externa.

No mesmo sentido, a ausência do Brasil levanta suspeitas. Quando surgiu o projeto de cooperação militar entre Rússia, China e África do Sul, em 2019, Brasília vivia a fase mais pró-EUA do governo Bolsonaro, quando havia uma política de alinhamento automático com Trump, razão pela qual o distanciamento do Brasil das iniciativas do BRICS era esperado. Agora, porém, espera-se que Lula assuma uma postura mais soberana e pró-BRICS.

Para o Brasil, assim como para a Índia, seria extremamente interessante participar dos atuais exercícios militares, pois muita experiência de combate seria repassada aos militares, preparando-os para um eventual cenário de conflito no futuro. Porém, mais do que uma questão meramente militar, trata-se de uma manobra essencialmente geopolítica. É preciso que Brasil e Índia contribuam mais ativamente com os demais parceiros, para que os BRICS dêem um passo além da mera colaboração econômica.

Se os BRICS passarem a se engajar em projetos de apoio militar mútuo, maior será a confiança recíproca entre os membros, pois conhecimento e dados serão compartilhados, tornando-os igualmente fortes para enfrentar desafios comuns. Se a consolidação de um mundo multipolar é realmente um objetivo de todos os membros do BRICS, é fundamental que as rivalidades e divergências internas sejam superadas e que todos cooperem para um objetivo comum.

Fonte: Infobrics

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Lucas Leiroz

Ativista da NR, analista geopolítico e colunista da InfoBrics.

Artigos: 597

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